Muito se fala sobre psicopatia. Muito se fala sobre Dexter. O primeiro é um termo utilizado há séculos para designar assassinos seriais e pessoas "sem coração" em geral. O segundo é um seriado americano surgido em 2006 que retrata a história de um homem (Dexter Morgan) e nascido "sem coração" que vai "se humanizando" com os anos. "A humanização" teria como ponto de partida um "código" de conduta ensinado por seu pai, durante sua infância, adolescência e início da vida adulta.
O termo "psicopatia", "psicopata", psicose", "psicótico" são praticamente intercambiáveis no senso comum, no uso popular, no imaginário geral. Mas na realidade científica são diferentes. E este pode ser um dos casos onde o fato de se pensar diferente o senso comum e o senso restrito pode trazer consequências danosas para as pessoas leigas.
Psicopatia é uma doença médica-psiquiátrica catalogada no CID-10 (Classificação internacional de doenças da Organização Mundial de Saúde). Psicopatia não é psicose. Portanto, nada tem a ver com loucura ou insanidade. O psicopata sabe perfeitamente o que está fazendo ou deixando de fazer.
O termo técnico adequado é Transtorno de personalidade Antissocial. É uma doença da personalidade, onde o jeito de ser da pessoa, a personalidade dela, envolve um conjunto constante, estável no tempo e difícil de mudar de características ligadas a insensibilidade e desrespeito aos direitos alheios, falta de capacidade de se colocar no lugar do outro, baixo limiar de frustração, tendência a mentir repetidamente e não aprender com as experiências negativas, crueldade e por ai vai... Psicopatia é sinônimo de sociopatia, personalidade dissocial ou amoral. Também são termos técnicos do CID-10.
Epa... amoral? Seria a falta de moralidade no comportamento uma doença?
Sim, de acordo com o CID-10.
Ora, o que é o comportamento moral? Segundo o dicionário Aurélio, moral "é conjunto de regras de conduta consideradas como válidas, éticas, quer de modo absoluto para qualquer tempo ou lugar, quer para grupos ou pessoa determinada". Nossa moral ocidental, influenciada pela moral cristã, está relacionada às virtudes morais, como bondade, caridade, pureza de coração, humildade, paciência, perdão, e tudo o mais.
Mas adivinha só... quais os critérios diagnósticos da psicopatia? Vejamos:
A. Um padrão invasivo de desrespeito e violação dos direitos dos outros, que ocorre desde os 15 anos, como indicado por pelo menos três dos seguintes critérios:
(1) fracasso em conformar-se às normas sociais com relação a comportamentos legais, indicado pela execução repetida de atos que constituem motivo de detenção
(2) propensão para enganar, indicada por mentir repetidamente, usar nomes falsos ou ludibriar os outros para obter vantagens pessoais ou prazer
(3) impulsividade ou fracasso em fazer planos para o futuro
(4) irritabilidade e agressividade, indicadas por repetidas lutas corporais ou agressões físicas
(5) desrespeito irresponsável pela segurança própria ou alheia
(6) irresponsabilidade consistente, indicada por um repetido fracasso em manter um comportamento laboral consistente ou honrar obrigações financeiras
(7) ausência de remorso, indicada por indiferença ou racionalização por ter ferido, maltratado ou roubado outra pessoa
B. O indivíduo tem no mínimo 18 anos de idade.
C. Existem evidências de Transtorno da Conduta com início antes dos 15 anos de idade.
D. A ocorrência do comportamento anti-social não se dá exclusivamente durante o curso de Esquizofrenia ou Episódio Maníaco.
Fracasso em ater-se às normais sociais, propensão para enganar, comportamentos ilegais, agressividade, impulsividade, irresponsabilidade, ausência de remorso. Tudo isso de modo constante, contínuo e estável, predominando na maioria das situações ao longo da vida de um indivíduo. O que isso tem a ver com comportamento moral? nada. O psicopata é o amoral. E se bondade está associada à moral, a maldade está associada à amoralidade. Logo, o psicopata é o mal. O mal sistemático. O mal (em tese) incorrigível. O sacana, o calhorda, o que "não vale nada". A prevalência de psicopatas entre os criminosos é 15 vezes a da população em geral.
Contudo, vimos acima que, de 7 critérios, há apenas a necessidade de 3 para o diagnóstico de psicopatia. Portanto, pode haver psicopatas que sintam remorso de vez em quando, ou que mintam menos, ou que se irritem menos, e por ai vai. É ai que pode entrar Dexter.
Dexter é um cara comum. Americano médio, trabalhador, sossegado, come ovos com bacon pela manhã, paga seus impostos e tudo o mais.
Mas este cara gosta de matar, de tirar vidas. Este cara PRECISA matar. É o seu "passageiro sombrio".
Um homem que tem no ato de matar uma NECESSIDADE profunda e inexplicável (como a de comer, reproduzir ou fazer sexo) tem a nível de necessidade básica uma necessidade que, na maioria das pessoas, só se incutiria em situações de grave ameaça à própria sobrevivência.
Como Dexter pode, portanto, amar a irmã a namorada, o filho e sentir repulsa por outros psicopatas que, ao contrário dele, não têm um código?
Pelo simples fato de que nem todo psicopata apresenta todas as características que podem ter em um psicopata. Nem todos terrão os 7 critérios. E Dexter, em muitos casos, sente remorso, não é tão impulsivo com outras situações da vida e canaliza sua agressividade e irritabilidade. Ao contrário dos outros, ele tem como foco principal "não ser pego", e por isso sistematiza sua impulsividade ao matar apenas "os que merecem" em condições de (quase) plena segurança. É um psicopata "domesticado". E para mim, perfeitamente plausível.
Pode ser que Dexter seja um "psicopata abortado", pois alguém pode dizer que ele não preenche todos os critérios, ou quase nenhum. Do mesmo modo que alguns precisam fumar, alguns precisam sair todas as noites, alguns precisam dar socos em sacos de areia, Dexter precisa matar. E se for apenas isso e mais nada? matar por matar e mais nada faz de alguém um ser amoral? e se Dexter fosse sinceramente caridoso e piedoso, será que conseguiria suprimir esta vontade de matar?
Precisamos nos acostumar que pessoas boas fazem coisas ruins. Pessoas ruins dificilmente ou muito pouco frequentemente fazem coisas boas. Ambas matam. Dexter pode ser uma ou outra, que têm em comum a vontade de matar. Por prazer. E mais nada.
Quem é Dexter? O que é Dexter?
Quem é você?
domingo, 16 de dezembro de 2012
terça-feira, 27 de novembro de 2012
MONSTRO
Acho que estou ficando louco
Hoje acordei querendo falar com Deus
Não consegui e deixei um recado
Foda-se!
Só tenho uma vida
Vivemos dias tão estranhos
Meus desejos são maiores do que um
simples mecanismo de fé
Sons e fúria afogam meu coração
As regras que tenho fazem as pessoas
dizerem
Que sou estranho e solitário
É valoroso para um homem como eu
Que existam certas armaduras
Um homem deve construir uma fortaleza
para se defender
Mas você está pronto para compreender?
Você está pronto?
Para se sensibilizar?
Para se alegrar?
Para complicar?
E criar um turbilhão de emoções?
Seja verdadeiro mesmo que esse seja o
único caminho
Acredite sempre na ternura de seus olhos
Levante sua âncora
Olhe para frente
A situação será mais fácil
Acredite!
O seu lugar no mundo é onde você quer
estar
(George B. dos Santos)
domingo, 18 de novembro de 2012
Cartas a um jovem dinamarquês
As indicações de música e literatura desse post me foram apresentadas por um grande e novo amigo que acabou entrando na minha vida quase sem querer e em pouco tempo já estava me fazendo refletir sobre minhas perspectivas mais centrais sobre a arte.
Sem entrar muito em detalhes biográficos e indo direto ao ponto, Tim Christensen faz um tipo de som capaz de capturar imediatamente e com extrema força os ouvintes mais atentos da boa música. Sem estilo definido, o dinamarquês de 38 anos tem uma capacidade criativa melódia impressionante, um compositor finíssimo, suportado por uma banda impressionante. Sem muita enrolação deixo vocês com duas músicas que eu considero sensacionais.
Essa me fez chorar na primeira audição e vai diretamente para o set list do meu casamento:
"Paris, fevereiro de 1903. Rainer Maria Rilke (1875-1926) recebe uma carta de um jovem chamado Franz Kappus, que aspira tornar-se poeta e que pede conselhos ao já famoso escritor. Tal missiva dá início a uma troca de correspondência na qual Rilke responde aos questionamentos do rapaz e, muito mais do que isso, expõe suas opiniões sobre o que considerava os aspectos verdadeiros da vida.
A criação artística, a necessidade de escrever, Deus, o sexo e o relacionamento entre os homens, o valor nulo da crítica e a solidão inelutável do ser humano: estas e outras questões são abordadas pelo maior poeta de língua alemã do século XX, em algumas das suas mais belas páginas de prosa."
Cartas a um jovem poeta entrou na minha vida em momento extremamente delicado. Eu estava com grandes dificuldades em encaixar meu potencial artístico dentro de uma vida atarefada e em muitas vezes fria. Os momentos de melancolia estavam se tornando cada vez mais frequentes, as dúvidas sobre as direções estavam tenazes, um trigal de interrogações estava pairando no meu horizonte. E esse livro entrou como conselhos de um irmão mais velho, um pai, um grande amigo, me trouxe alento para essa fome que só quem ama a criação artística, só quem coloca a alma no seu trabalho conhece. Chorei, ri, beijei o livro algumas vezes. Essa viagem de introspecção, de ensimesmação que Rilke propõe a Kappus é tão profunda e intensa que o livro acaba se tornando um elogio à solidão. Atrever-se a escrever só depois desse contato consigo mesmo e de se sentir parte da natureza, quando o ato de escrever se tornasse imprenscindível, visceral. Não é lindo isso? Aliás, o Rilke é conhecido como o poeta da solidão justamente por esse livro. E essa viagem de introspecção proposta por ele serve para qualquer pessoa, mesmo aquelas que não desejam um dia escrever. Resiliência? Tenacidade? Auto-piedade? Conflitos existenciais? Sensibilidade exagerada para um cotidiano congelante? Muito obrigado Raine Maria Rilke (e Cecília Meirelles pela tradução): você mudou a minha vida.
segunda-feira, 5 de novembro de 2012
O dia dos homens
Alguma tarde. Dia útil. Sol soteropolitano. Setembro de 1999. Colégio. Estava de farda, espinhas na cara, alguns quilos a menos, sanduíche hipercalórico na mão. Cabeça introvertida, reacionária, apaixonada, dinâmica, amedrontada, cheia de ideias de esquerda. Cabelo rebelde. Esquerda vermelha sim. De barba. Lenin, Lula, Che Guevara, Cuba, Ho Chi Mihn. Olhos brilhantes, professores vibrantes. Violão, música, festa. Angústia, busca de sentido. Garotos exaltados, garotas deslumbradas...
Deste adolescente, anonimamente "acomunistado", restou um adulto trintão com muita vontade de melhorar o mundo. Pelo menos o que está ao seu redor.
Mas os métodos são outros. A vida é outra. O mundo ainda é o mesmo.
Estava eu numa segunda-feira. Final de "expediente". Hora de descansar a mente e, como diriam os biólogos evolutivos, "olhar a fogueira para passar os canais de TV". Abri minha agenda para passar os compromissos do dia seguinte, e assim também iniciar os escritos do meu diário.
Ah não! não é que por um feliz (ou infeliz) acaso eu a abri no dia 8 de março, o famoso dia das nossas mulheres? pois é. Não por nada, fui arremessado a um labirinto de pensamentos por muitos avaliados como politicamente incorretos. Talvez eu queira me sentir privilegiado em pelo menos um dia no ano.
Enfim... vamos aos fatos.
Porque um dia para as mulheres? se a ideia de oferecer-lhes um dia as tornam especiais, há para isso, portanto, em suposição, dois motivos: (1) ou são, no grosso falar, no popular, mais privilegiadas, melhores, em algum(s)aspecto, ou (2) o contrário de tudo isso.
Portanto, trata-se ou de um grosseiro erro histórico, ou cultural, ou de matemática, já que soa absurdo reservar um dia de comemoração para metade da população mundial (ou 3 bilhões de mulheres). Por que não comemorar logo a humanidade toda? "dia do ser humano". Pronto. todo mundo feliz. Mas não. Oferecer-lhes um dia no nosso gregoriano calendário para exaltar-lhes a essência gonádica ou o que quer que seja remete, no mínimo, a um lapso de memória cultural.
Porque essa tempestade em copo d'água?
Porque eu quero um dia pra mim. Tenho apenas o meu aniversário. Não sou "minoria". Não sou mulher, nem índio, nem fundei nem inventei nada. Não pertenço a nenhuma igreja nem sou descendente de uma etnia em especial. Não sou santo, nem negro, nem homossexual. Não sou minoria, já disse! Sou homem, pardo, miscigenado, classe média, comum, igual, multidão!
Se as "minorias" têm direito, seja por conquista, piedade histórica (ou o que mais tentem justificar) a um dia especial para si no calendário (ou a programa de TV especial, ou a uma revista especial, ou igreja, ou país, ou partido político...), pra quê insistir na pretensa suposta missão de atingir a "igualdade" com a maioria? ora, ser minoria é muito melhor! direitos especiais, tratamento especial, chancela da cultura, comiseração da história... tremenda hipocrisia. "Não luto para ser igual" pensam. "Luto para que me vejam, para que me notem".
Eu NÃO quero igualdade. Eu, na minha condição de maioria-perdida-na-multidão, quero DIFERENÇA! Diferença, mas com originalidade. Diferença, mas com respeito. Diferença, mas com igualdade. Iguais na diferença. É muito cômodo insistir na síndrome-do-irmão-caçula em manter-se no conforto da minoria "oprimida". Ora!
Represento, portanto, na minha cósmica insignificância, o sofrimento da "maioria" sem dia no calendário. Sem programa de TV, sem associação de defesa, sem revista especializada, sem delegacia especializada, sem sal, sem cor, sem sexo, intimamente ofendida por ser réu de um crime filosófico-histórico-cultural-político: não ter rótulo.
Reacionário?
No dia em que eu precisar desesperadamente desse amigo rótulo para sobreviver, transformarei anonimamente o dia 29 de fevereiro de algum ano bissexto no DIA DOS HOMENS. Pelo menos, nesta data, a chance de eu ser massacrado por um grupo feminista, ou qualquer coisa do gênero, seria bem menor.
Portanto, trata-se ou de um grosseiro erro histórico, ou cultural, ou de matemática, já que soa absurdo reservar um dia de comemoração para metade da população mundial (ou 3 bilhões de mulheres). Por que não comemorar logo a humanidade toda? "dia do ser humano". Pronto. todo mundo feliz. Mas não. Oferecer-lhes um dia no nosso gregoriano calendário para exaltar-lhes a essência gonádica ou o que quer que seja remete, no mínimo, a um lapso de memória cultural.
Porque essa tempestade em copo d'água?
Porque eu quero um dia pra mim. Tenho apenas o meu aniversário. Não sou "minoria". Não sou mulher, nem índio, nem fundei nem inventei nada. Não pertenço a nenhuma igreja nem sou descendente de uma etnia em especial. Não sou santo, nem negro, nem homossexual. Não sou minoria, já disse! Sou homem, pardo, miscigenado, classe média, comum, igual, multidão!
Se as "minorias" têm direito, seja por conquista, piedade histórica (ou o que mais tentem justificar) a um dia especial para si no calendário (ou a programa de TV especial, ou a uma revista especial, ou igreja, ou país, ou partido político...), pra quê insistir na pretensa suposta missão de atingir a "igualdade" com a maioria? ora, ser minoria é muito melhor! direitos especiais, tratamento especial, chancela da cultura, comiseração da história... tremenda hipocrisia. "Não luto para ser igual" pensam. "Luto para que me vejam, para que me notem".
Eu NÃO quero igualdade. Eu, na minha condição de maioria-perdida-na-multidão, quero DIFERENÇA! Diferença, mas com originalidade. Diferença, mas com respeito. Diferença, mas com igualdade. Iguais na diferença. É muito cômodo insistir na síndrome-do-irmão-caçula em manter-se no conforto da minoria "oprimida". Ora!
Represento, portanto, na minha cósmica insignificância, o sofrimento da "maioria" sem dia no calendário. Sem programa de TV, sem associação de defesa, sem revista especializada, sem delegacia especializada, sem sal, sem cor, sem sexo, intimamente ofendida por ser réu de um crime filosófico-histórico-cultural-político: não ter rótulo.
Reacionário?
No dia em que eu precisar desesperadamente desse amigo rótulo para sobreviver, transformarei anonimamente o dia 29 de fevereiro de algum ano bissexto no DIA DOS HOMENS. Pelo menos, nesta data, a chance de eu ser massacrado por um grupo feminista, ou qualquer coisa do gênero, seria bem menor.
Às mulheres (com respeito à minha noiva, mãe e irmãs), feliz aniversário de auto-segregação!
Bem... até a próxima encarnação.
quarta-feira, 31 de outubro de 2012
Como lidar com o dinheiro?
Não é tarefa
fácil quando o assunto é administração de grana. Posso dizer, pois trabalho e
vejo isso todos os dias. E sempre é o mesmo cenário. É recorrente encontrar
situações em que pessoas têm dificuldades financeiras por não possuir
habilidades suficientes. O centro de toda a problemática está a falta de
autocontrole, ou seja, mesmo consciente da necessidade de poupar, as pessoas
simplesmente não conseguem por conta da inércia, procrastinação ou até mesmo
pela falta de força de vontade.
Contudo,
esse tema é bem mais profundo do que buscar o autocontrole nas finanças ou ter
habilidades em planilhas, relatórios financeiros e cálculos numéricos. Há 5
anos na minha formação em economia esse tema me chamou bastante atenção e
desenvolvi todo o trabalho de conclusão de curso nessa linha.
Durante os
estudos encontrei os temas Psicologia Econômica (PE) e Finanças Comportamentais
(FC) onde os aspectos psicológicos são analisados e podem explicar a
dificuldade que temos em lidar com o dinheiro. A PE e, especialmente, as FC
revela que os princípios das finanças tradicionais têm sérias falhas.
Toda a
origem das Finanças tradicionais está ligada aos trabalhos de Gerald M. Loeb,
Benjamin Graham, Edwards Dewing, entre outros. De acordo com a análise
financeira tradicional o mercado (soma dos investidores que compram e vedem um
determinado ativo) está, em certas situações, em desequilíbrio e por isso
deve-se buscar a formação de carteiras com o objetivo de adquirir um retorno
maior que a média do mercado.
Nos anos 50
Markowitz estabeleceu novas bases para as finanças, que passou a se chamar
Finanças Modernas. E a partir de então as Finanças Modernas passaram a
considerar a racionalidade dos tomadores de decisão e a imprevisibilidade do
mercado. Nessa perspectiva surgiram diversos modelos no intuito de fortalecer
essa nova teoria, como o Teorema da Irrelevância, o CAPM e a Teoria do
Portfólio. Além disso, as Finanças Modernas tomava como base o conceito da
Teoria da Utilidade Esperada (TUE), que foi fortalecida com trabalho de Von
Neumann e Morgenstern, no qual mostraram a ideia de homem econômico racional
através da Teoria dos Jogos. DE maneira geral a TUE diz que em situações
de incertezas os indivíduos buscam processar as informações disponíveis com o
intuito de maximizar seus objetivos.
Porém, a ideia de racionalidade dos agentes financeiros nas tomadas de decisões, proposto pelas Finanças Modernas, passou a ser contestada, a partir dos anos 70 com surgimento da Psicologia Cognitiva que apresentou estudos violando o conceito da racionalidade, dando origem as Finanças Comportamentais. Os estudos relacionados às Finanças Comportamentais foram incorporados ao contexto de finanças em decorrência das anomalias irracionais produzidas pelas crises financeiras que não conseguiram ser explicadas pelo modelo Moderno de Finanças.
Os psicólogos Daniel Kahneman e Amos Tversky procuram entender como se processa as decisões na mente humana, demonstraram que as decisões dos investidores passam por processo heurístico, ou seja, são criados modelos para tomar decisões complexas em um ambiente de risco e incerteza. Os indivíduos não processam de forma objetiva todas as informações para se chegar a uma decisão racional, ao invés disto, utilizam atalhos mentais ocasionando em importantes vieses de decisões.
Em 1979 foi
publicado por Kahneman e Tversky o artigo Judment under uncertainty:
heuristics and biases (artigo parâmetro para o meu TCC) na revista Econometrica,
em que criticavam a TUE, no qual desenvolveram um novo modelo chamado Teoria do
Prospecto (Prospect Theory). Eles apresentaram um teste, ilustrado
abaixo, que consiste na escolha entre ganhos e perdas. Comprovando que muitas
das decisões sob incerteza divergem das predições da TUE.
Suponha que
você possa escolher entre dois jogos:
Jogo 1: você tem
chance de 20% de ganhar R$ 10,00 e de 80% de não ganhar nada.
Jogo 2: você tem
chance de 10% de ganhar R$ 50,00 e de 90% de não ganhar nada.
Qual jogo
você gostaria de jogar?
De acordo
com a TUE o jogo 2 seria a decisão mais correta, pois a probabilidade de ganho,
em relação ao jogo 1, é maior (10% x 50 + 90% x 0 = 5). E geralmente as pessoas
tendem a chegar a esse resultado. Mas nem sempre é assim. Tome como exemplo
seguinte proposta:
Jogo 3: você tem 1%
de chance de ganhar R$ 1.000 e 90% de chance de não ganhar nada.
Jogo 4: você tem
100% de chance de ganhar R$ 5.
Foi
constatado por Kehneman e Tversky que mais de 50% das pessoas preferem, nessa
segunda fase do teste, o jogo 4. No entanto, considerando a TUE, não é a
escolha mais correta, pois a probabilidade de ganho (100% x 5 = 5) é menor que
a do jogo 3 (1% x 1.000 + 99% x 0 = 10).
Com a
aplicação dos testes os autores chegaram a padrões de comportamento dos
indivíduos que são inconsistentes com os princípios da TUE. Para a teoria do
prospecto esse comportamento pode ser explicado também pelo Efeito Reflexo (as
pessoas tem maior aversão ao risco no campo dos ganhos) e o Efeito Isolamento
(quando a mesma escolha é apresentada de forma diferente as pessoas tendem a
tomar decisões inconsistentes).
Segundo a
teoria os investidores não agem de maneira totalmente racional no momento da
tomada de decisão e são avessos aos riscos para os ganhos e propensos ao risco
nas perdas. Essas ilusões cognitivas podem ser comparadas às ilusões de ótica.
Mesmo quando se sabe que está diante de uma ilusão cognitiva é difícil evita-la
e agir de maneira racional.
A Teoria do Prospecto demonstrou que os humanos
procuram simplificar o processo de decisão e, na tentativa de tornar a tarefa
mais simples e mais rápida, fazem uso de “atalhos mentais” ou regras
heurísticas para tomar decisões.
Sem dúvida a Teoria do Prospecto ajudou na descrição do comportamento individual dos tomadores de decisão em situação de risco. E em parte revelou o nosso relacionamento com o dinheiro. Portanto, da próxima vez que ficar sem grana no final do mês não pensem que é incapaz financeiramente e também não se preocupe tanto, pois as vezes precisamos ser humanos.
segunda-feira, 22 de outubro de 2012
Orquestra de bits
Durante anos a fio toquei minha vida dupla entre aspirante a
músico e analista de sistemas. Essa duplicidade começou no meu primeiro ano de
faculdade até... esqueça! Isso nunca acaba. Enquanto fui passando de disciplina
em disciplina aprendendo como se estruturar um sistema, quais seus pilares,
fundamentos, o que era um banco de dados, uma programação em três camadas,
protocolos, orientação a objeto, sistemas operacionais, também passava tardes
arrumando shows seja pelo DCE da UFBA seja nos barzinhos do Rio Vermelho.
Dividia meu tempo estudando estrutura de arquivos e quebrando a cabeça entre
semínimas e licks de guitarra.
Quando comecei a compor fui me familiarizando com as
estrutura musicais e suas infinitas derivações. Onde encaixar o verso em cima
de uma melodia, quais construções frasais mais me agradavam, como o mesmo
instrumento pode exercer papeis diferentes, as combinações de cordas e peso,
enfim. Com o tempo eu e meus companheiros de banda fomos aprimorando nossa
visão da música dentro da coletividade, aprendemos o que realmente significa
uma intensa e completa harmonia entre os músicos, como a gentileza é
fundamental para a organicidade de um conjunto, equalizações, aprimoramos
nossos ouvidos para detectar os erros mais silenciosos.
Paralelo a todo esse processo eu seguia firme e forte com
minha profissão de analista de sistemas. Dentre as diversas premissas fascinantes
que o mundo da tecnologia traz o que mais me chamava (ou chama) a atenção era a
capacidade de abstração das situações do mundo real para as máquinas. Um
conjunto de instruções que sequenciadas executam uma tarefa. Sendo pragmático e
extremamente generalista é isso que um computador faz. Uma poderosa ferramenta
que possibilita a expansão do alcance dos sentidos primários dos homens.
Aprender a captar a mais fina necessidade de uma pessoa, equipe ou empresa e
colocá-la em termos computacionais para daí projetar, desenvolver e entregar um
sistema com precisão, eficácia e eficiência é quase um trabalho abstrato,
entretanto com todos os componentes concretos possíveis. Ao mesmo tempo em que
o sistema deve dar a solução precisa do problema proposto ele deve ser usual,
performático, elegante, tudo isso na mesma proporção da sua eficácia.
Lidar com todas essas variáveis é como um maestro em frente
a uma orquestra pronto para executar uma peça de sua autoria. Como guiar os primeiros
violinos de modo que eles não se choquem com as flautas? Como dar brilho aos violoncelos
sem concorrer com as trompas? É fácil harmonizar o coral masculino com aquela
passagem diminuta que as violas estão marcando? E numa banda de rock, como
fazer que uma cadência harmônica de samba soe bem com a cozinha “sentando a mão”
na pegada, como colocar aquela distorção doce numa les paul para não esconder
um acorde com sexta, e além de tudo fazer tudo isso soar natural? Como cantar
belos versos em melodias não tão triviais para uma banda de rock e ainda assim não
perder a veia pop e direta que muitas vezes o rock exige?
Comparando as duas ferramentas música e tecnologia são em
sua essência técnica mais primária pura matemática. Ambas permitem a combinação
de infinitos elementos onde do mesmo princípio chega-se em destinos completamente
diferentes a depender de quem as cria. Nenhuma
delas sobrevive sem o talento dos músicos e programadores, compositores a
analistas, técnicos e servidores.
Na minha humilde opinião o que as torna completamente
diferentes é o resultado final. Um sistema pode ser belo, preciso, extremamente
relevante para todos (Google que o diga), performático, eficaz, mas invariavelmente
seu resultado é frio. A música carrega em si a capacidade de tocar as almas, de
fazer dançar, de levar às lágrimas, de alegrar, de mudar uma vida, de dar
amplitude à poesia, de levar a cultura de um povo a outro, de possibilitar a
comunicação entre pessoas de idiomas distintos, de traduzir o intraduzível. Que
novas composições venham, que os maestros dos bits continuem compondo grandes
soluções, que os analistas de semínimas nos emocionem com suas orquestras de zeros
e uns.
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