terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

We are carnaval!!


Eu estava preparando um texto sobre o carnaval, comecei a levantar alguns dados, até me deparar com um texto felicíssimo do meu querido amigo Eduardo Lubisco. Não sou muito de replicar conteúdo aqui no blog, mas quando acho umas pérolas dessas prefiro referenciar e apenas bypassar a informação. Então deleitem-se nas palavras extremamente felizes do grande Javier Bardem (:P).



MIJO & RED BULL



“Ah, que bom você chegou/bem vindo a Salvador/coração do Brasil”

Não, você não é bem vindo ao nosso carnaval. O folião-turista, sim, claro. Mas, Bel, Durval, Ivete, Daniela e todos os outros que enriquecem a custas da senzala e da reinvenção dos navios negreiros, por favor, deixem minha cidade em paz.

 O carnaval soteropolitano é a maior festa privada do planeta. A população local é expulsa da sala de estar, enquanto as visitas do síndico se lambuzam com a comida e bebida servidas pelos moradores, agora, confinados entre a cozinha e o quartinho dos fundos.

Salvador é uma cidade com aproximadamente 2,6 milhões de habitantes. Segundo os dados da SECULT  relativos ao carnaval de 2010 (a variação dos números em relação a 2008 e 2009 são mínimas), deste total, 2,02 milhões (77,8%) não participam da festa, sendo que 1,57 milhão (60,5%) ficam em casa e 452 mil (17,4%) viajam.

Restam, então, pouco mais que 570 mil residentes (22,1%) participando da folia. Destes, 478 mil (18,5%) brincam, enquanto 93 mil (3,6%) trabalham.

Para não perdermos o raciocínio, vamos lá: até agora, somente 18,5% dos residentes de Salvador brincam o carnaval. Ou seja, em um universo de 2,6 milhões pessoas, apenas 478 mil participaram como foliões.

Ainda piora. Dentro do universo dos foliões locais, aproximadamente 59% pularam exclusivamente na pipoca, ou seja, pouco mais de 288 mil residentes. O restante (190 mil) se dividiu entre bloco; camarote; bloco e pipoca; camarote e pipoca; bloco, camarote e pipoca.

Caso esteja, assim como eu, tonto com tantos números, indico o contraste mais importante até agora, a meu ver: de 2,6 milhões de habitantes, somente 288 mil participaram do carnaval pipoca, gratuito, popular.

Há, contudo, entre defensores do carnaval para inglês ver, digo, para paulista participar, o argumento da injeção de dinheiro e oportunidade de a população ajudar na renda familiar durante um curto período de tempo. Para eles, a triste realidade: o rendimento médio real dos indivíduos que trabalharam durante os dias do período de análise é de R$ 737,02.

Isso mesmo, senhoras e senhores, entre os 2,6 milhões de habitantes de Salvador, 93 mil (3,57%) trabalham para ganhar, em média, R$ 737,02.

Em 2012, o então vice-prefeito, Edvaldo Brito, afirmou que ”o carnaval gerou aos cofres municipais um prejuízo parcial de R$ 8 milhões com a organização da festa.”.

Oxe, mas com tanto patrocínio, vendas de abadás, camisetas e impostos, para onde vai todo este dinheiro? Abrir um camarote não custa exatamente uma fortuna. A taxa inicial paga à prefeitura é de R$ 10,58 e mais R$ 42,34 por metro quadrado. Então, levando em consideração que o faturamento de um camarote pode chegar a R$ 14,4 milhões, não posso afirmar, mas tenho uma leve desconfiança a respeito de quem está faturando nessa brincadeira... 

A lógica dos blocos de trio não pode ser mais nefasta. Pessoas pagam para andar sobre o mesmo asfalto, sob as mesmas intempéries, sofrendo o mesmo aperto e ouvindo a mesma música que todo mundo. Porém, estão devidamente cercadas por uma corda que as aproxima dos seus semelhantes - gente selecionada e bonita - e os protege do povão, do feio, do pobre e do preto

 Já os camarotes são esquizofrênicos. Dentro daquelas bolhas assépticas, semelhantes se reconhecem para celebrar Baco com litros de whisky + energético, isolados dos festejos populares que, coincidentemente, acontecem logo ali no mundo real.

Carnaval popular não passa de meia página nos livros de história, de uma nostalgia, de um devaneio romântico de alguns que ainda preferem o perfume de mijo no asfalto ao fedor do arroto de whisky com Red Bull.


5 comentários:

  1. Old, but gold! :) Pesquisa de 2011 feita sobre o carnaval de 2010. http://www.cultura.ba.gov.br/2011/07/07/infocultura/

    E outra, acho mais legal quando vc usar suas palavras, em vez de colar textos. :)

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  2. Me divido entre a vontade insuportável de fugir dessa cidade, entre o amor insistente às pessoas que tenho aqui, entre o nojo e a náusea de conviver com aqueles que financiam essa tragédia coletiva.
    Falo por mim. Em 1998 fiquei 10 minutos dentro do bloco crocodilo, mais algumas noites no camarote da PM. Lembro de ficar observando NA MAIOR PARTE DO TEMPO, no numero de segundos que os trios levavam para atravessar o espaço entre três postes. Observava quantas vezes uma menina qualquer beijava um cara qualquer. Observava as estrelas. Observava as caras de robô dos guitarristas e baixistas que repetiam com maestria o que fizerem em horas exaustivas de ensaio. Se tivesse um décimo da técnica deles, jamaaais me venderia por tão pouco. Eles não passam fome.
    Em 2002 estive num camarote qualquer, tomei 3 cervejas e dormi ás 23h num puff. Em 2006 sai no nana banana com minha atual noiva, e quase agredi um ambulante porque suspeitei, tresloucado pelo ambiente e pela minha sombra amedrontada, que ele fosse fugir com 2 reais.
    Em todos os outros anos: em casa, estudando, jogando videogame, fazendo nada, ouvindo gozação antinerds, ou viajando.
    Odeio axé e pagode.
    Odeio a maldade. Odeio o vicio.
    Odeio mais ainda a cultura que estimula esses foliões, "pessoas de bem", a "financiar essa P****"

    Segundo um site qualquer, existem 36.722 cidades no mundo. Por que fomos escolhidos, meu Deus?
    vou continuar tentando a loto facil

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  3. Valeu Colares! Eu também prefiro escrever, mas o resultado dessa vez ia se aproximar demais do conteúdo gerado por Lubisco, então dessa vez preferi referenciá-lo.

    Bozo, meu filho, penso isso desde que eu era um espermatozoide nos colhões de meu pai, mas evito falar para não ser linchado pelos nossos conterrâneos politicamente corretos e acéfalos.

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  4. Sem muitas palavras. CARNAVAL! Rostos aparentemente felizes denunciando a alegria falsificada de um povo contraditório. Essa é a minha cidade, esse é o meu país.

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  5. De fato. Rapaz, esses dados são foda. E Lubisco foi bem sintético.

    Eu nasci aqui, mas esta não é minha cidade, nem meu país. :(

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