terça-feira, 27 de novembro de 2012

MONSTRO


Acho que estou ficando louco
Hoje acordei querendo falar com Deus
Não consegui e deixei um recado
Foda-se!
Só tenho uma vida
Vivemos dias tão estranhos
Meus desejos são maiores do que um simples mecanismo de fé
Sons e fúria afogam meu coração
As regras que tenho fazem as pessoas dizerem
Que sou estranho e solitário
É valoroso para um homem como eu
Que existam certas armaduras
Um homem deve construir uma fortaleza para se defender
Mas você está pronto para compreender?
Você está pronto?
Para se sensibilizar?
Para se alegrar?
Para complicar?
E criar um turbilhão de emoções?
Seja verdadeiro mesmo que esse seja o único caminho
Acredite sempre na ternura de seus olhos
Levante sua âncora
Olhe para frente
A situação será mais fácil
Acredite!
O seu lugar no mundo é onde você quer estar

 (George B. dos Santos)

domingo, 18 de novembro de 2012

Cartas a um jovem dinamarquês

As indicações de música e literatura desse post me foram apresentadas por um grande e novo amigo que acabou entrando na minha vida quase sem querer e em pouco tempo já estava me fazendo refletir sobre minhas perspectivas mais centrais sobre a arte.

Sem entrar muito em detalhes biográficos e indo direto ao ponto, Tim Christensen faz um tipo de som capaz de capturar imediatamente e com extrema força os ouvintes mais atentos da boa música. Sem estilo definido, o dinamarquês de 38 anos tem uma capacidade criativa melódia impressionante, um compositor finíssimo, suportado por uma banda impressionante. Sem muita enrolação deixo vocês com duas músicas que eu considero sensacionais.



Essa me fez chorar na primeira audição e vai diretamente para o set list do meu casamento:




"Paris, fevereiro de 1903. Rainer Maria Rilke (1875-1926) recebe uma carta de um jovem chamado Franz Kappus, que aspira tornar-se poeta e que pede conselhos ao já famoso escritor. Tal missiva dá início a uma troca de correspondência na qual Rilke responde aos questionamentos do rapaz e, muito mais do que isso, expõe suas opiniões sobre o que considerava os aspectos verdadeiros da vida.

A criação artística, a necessidade de escrever, Deus, o sexo e o relacionamento entre os homens, o valor nulo da crítica e a solidão inelutável do ser humano: estas e outras questões são abordadas pelo maior poeta de língua alemã do século XX, em algumas das suas mais belas páginas de prosa."

Cartas a um jovem poeta entrou na minha vida em momento extremamente delicado. Eu estava com grandes dificuldades em encaixar meu potencial artístico dentro de uma vida atarefada e em muitas vezes fria. Os momentos de melancolia estavam se tornando cada vez mais frequentes, as dúvidas sobre as direções estavam tenazes, um trigal de interrogações estava pairando no meu horizonte. E esse livro entrou como conselhos de um irmão mais velho, um pai, um grande amigo, me trouxe alento para essa fome que só quem ama a criação artística, só quem coloca a alma no seu trabalho conhece. Chorei, ri, beijei o livro algumas vezes. Essa viagem de introspecção, de ensimesmação que Rilke propõe a Kappus é tão profunda e intensa que o livro acaba se tornando um elogio à solidão. Atrever-se a escrever só depois desse contato consigo mesmo e de se sentir parte da natureza, quando o ato de escrever se tornasse imprenscindível, visceral. Não é lindo isso? Aliás, o Rilke é conhecido como o poeta da solidão justamente por esse livro. E essa viagem de introspecção proposta por ele serve para qualquer pessoa, mesmo aquelas que não desejam um dia escrever. Resiliência? Tenacidade? Auto-piedade? Conflitos existenciais? Sensibilidade exagerada para um cotidiano congelante? Muito obrigado Raine Maria Rilke (e Cecília Meirelles pela tradução): você mudou a minha vida.



segunda-feira, 5 de novembro de 2012

O dia dos homens


Alguma tarde. Dia útil. Sol soteropolitano. Setembro de 1999. Colégio. Estava de farda, espinhas na cara, alguns quilos a menos, sanduíche hipercalórico na mão. Cabeça introvertida, reacionária, apaixonada, dinâmica, amedrontada, cheia de ideias de esquerda. Cabelo rebelde. Esquerda vermelha sim. De barba. Lenin, Lula, Che Guevara, Cuba, Ho Chi Mihn. Olhos brilhantes, professores vibrantes. Violão, música, festa. Angústia, busca de sentido. Garotos exaltados, garotas deslumbradas...
Deste adolescente, anonimamente "acomunistado", restou um adulto trintão com muita vontade de melhorar o mundo. Pelo menos o que está ao seu redor.
Mas os métodos são outros. A vida é outra. O mundo ainda é o mesmo.
Estava eu numa segunda-feira. Final de "expediente". Hora de descansar a mente e, como diriam os biólogos evolutivos, "olhar a fogueira para passar os canais de TV". Abri minha agenda para passar os compromissos do dia seguinte, e assim também iniciar os escritos do meu diário.
Ah não! não é que por um feliz (ou infeliz) acaso eu a abri no dia 8 de março, o famoso dia das nossas mulheres? pois é. Não por nada, fui arremessado a um labirinto de pensamentos por muitos avaliados como politicamente incorretos. Talvez eu queira me sentir privilegiado em pelo menos um dia no ano. 
Enfim... vamos aos fatos.
Porque um dia para as mulheres? se a ideia de oferecer-lhes um dia as tornam especiais, há para isso, portanto, em suposição, dois motivos: (1) ou são, no grosso falar, no popular, mais privilegiadas, melhores, em algum(s)aspecto, ou (2) o contrário de tudo isso.
Portanto, trata-se ou de um grosseiro erro histórico, ou cultural, ou de matemática, já que soa absurdo reservar um dia de comemoração para metade da população mundial (ou 3 bilhões de mulheres). Por que não comemorar logo a humanidade toda? "dia do ser humano". Pronto. todo mundo feliz. Mas não. Oferecer-lhes um dia no nosso gregoriano calendário para exaltar-lhes a essência gonádica ou o que quer que seja remete, no mínimo, a um lapso de memória cultural.
Porque essa tempestade em copo d'água?
Porque eu quero um dia pra mim. Tenho apenas o meu aniversário. Não sou "minoria". Não sou mulher, nem índio, nem fundei nem inventei nada. Não pertenço a nenhuma igreja nem sou descendente de uma etnia em especial. Não sou santo, nem negro, nem homossexual. Não sou minoria, já disse! Sou homem, pardo, miscigenado, classe média, comum, igual, multidão!
Se as "minorias" têm direito, seja por conquista, piedade histórica (ou o que mais tentem justificar) a um dia especial para si no calendário (ou a programa de TV especial, ou a uma revista especial, ou igreja, ou país, ou partido político...), pra quê insistir na pretensa suposta missão de atingir a "igualdade" com a maioria? ora, ser minoria é muito melhor! direitos especiais, tratamento especial, chancela da cultura, comiseração da história... tremenda hipocrisia. "Não luto para ser igual" pensam. "Luto para que me vejam, para que me notem".
Eu NÃO quero igualdade. Eu, na minha condição de maioria-perdida-na-multidão, quero DIFERENÇA! Diferença, mas com originalidade. Diferença, mas com respeito. Diferença, mas com igualdade. Iguais na diferença. É muito cômodo insistir na síndrome-do-irmão-caçula em manter-se no conforto da minoria "oprimida". Ora!
Represento, portanto, na minha cósmica insignificância, o sofrimento da "maioria" sem dia no calendário. Sem programa de TV, sem associação de defesa, sem revista especializada, sem delegacia especializada, sem sal, sem cor, sem sexo, intimamente ofendida por ser réu de um crime filosófico-histórico-cultural-político: não ter rótulo.
Reacionário?
No dia em que eu precisar desesperadamente desse amigo rótulo para sobreviver, transformarei anonimamente o dia 29 de fevereiro de algum ano bissexto no DIA DOS HOMENS. Pelo menos, nesta data, a chance de eu ser massacrado por um grupo feminista, ou qualquer coisa do gênero, seria bem menor. 
Às mulheres (com respeito à minha noiva, mãe e irmãs), feliz aniversário de auto-segregação!
Bem... até a próxima encarnação.