quarta-feira, 29 de agosto de 2012

O Julgamento da Tristeza

Sequestrei a tristeza um dia
A rendi com minhas armas
Aprisionei com grades bem firmes
Onde não nascerá mais sol para ela

Pus a tristeza sob julgamento
Onde o juíz sou eu mesmo
O júri são meus poemas
E a promotora minhas canções

Deixei a tristeza chorar
Relatou sob holofotes os seus crimes
Lá onde o mundo foi concebido
Iniciou-se a sua romaria

A tristeza me disse que junto com a angústia criou arte
Especializou-se em arrancar lágrimas
Fingiu-se de penas para escrever versos cortantes
Manipulando seus poetas como fantoches

A tristeza relatou com muito orgulho
Que a saudade foi a sua filha mais pródiga
Nasceu do seu casamento com a distância
E criou consigo uma legião de vítimas

Contou-me com muito orgulho
Como conseguiu se transformar em acordes
Em músicas tão belas quanto devastadoras
Em refrões chorosos e redentores

E assim o seu julgamento foi desenrolando-se
Aos poucos fui percebendo
Como a tristeza tinha em si um imenso brilho
E uma devastadora grandeza

A platéia do mundo não existiria
O juri não teria nem nascido
A promotora seria muda
E o juiz desumano acordaria

O tempo passou...

De juiz tornei-me amante
De algoz passei a escravo
De aleijado virei músico
E de tacanha me fiz poeta

_____________________________________________________
Não sou de postar poesias aqui no Chocolate mas essa daí define bem um momento que ando passando ultimamente, refletindo sobre os desdobramentos da tristeza na psiquê dos homens, nas motivações e desmotivações que ela traz, nos aspectos espirituais, filosóficos, enfim. Quem sabe um dia eu poste alguma conclusão, mas por enquanto deixo as interrogações no ar.

Esse poema foi escrito por mim em 2007, por um Mateus que já morreu e renasceu vezes suficientes para apertar a mão deste camarada que vos escreve cinco anos depois, deixar algumas lições na mochila e concluir que ainda tenho muito o que aprender.

"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo."

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Cinética dos gases, cinética da vida


Mais uma história sobre o comportamento humano. Fato acontecido em dezembro de 2008, em São Paulo/SP




Engraçado. A caminho de casa, peguei-me a meditar sobre tempos pretéritos... quem diria que o futuro manteria o passado tão distante?
Colégio. Aula de química. Cinética dos gases. "Um gás é constituído por moléculas isoladas, separadas umas das outras por grandes espaços vazios em relação ao seu tamanho, e em contínuo movimento de translação, rotação e vibração, em todas as direções".
Num gesto de audácia, impulsionei meus pensamentos, fundo da minha anônima consciência, a igualar os gases à espécie humana. Os movimentos aparentemente caóticos e isolados dos gases não seriam análogos às infinitas coincidências cotidianas que (quase sempre) nos passam despercebidas? Pois bem.
Estava a procurar a estação de trem mais próxima. Outrora tomara o presente caminho, o qual, contudo, não recordava de todo. Sob tranquilizante pretexto acerca do caminho que suspeitava conhecer, abordei a primeira pessoa cuja visão periférica e preconceituosa me permitiu rotular como "minimamente confiável". Olhei para o lado.
- Pra estação é por essa rua mesmo? perguntei.
- É sim, com certeza. Eu estou indo pra lá. Ainda bem que construiram um trem por aqui, agora são apenas dezoito minutos de caminhada.
Era um homem alto, tez morena, troncudo, pouco acima dos quarenta anos. Paletó, gravata, sapatos engraxados. Belos sapatos. Pretos. Cabelo lambido para a esquerda, maleta preta à mão, caneta prateada no bolso da camisa. Não o olhei nos olhos, como que a saborear de antemão a não experimentada surpresa humana que a cinética dos gases da vida me enviava. O que seria?
- Pois é rapaz, eu tenho muita exeriência. Morava muito longe daqui, mais perto do centro, mais acabei mudando pra cá. Sabe como é. Deixei uma casa contruidinha, com trinta máquinas de costura embaixo. Tão lá. Mulher não quer saber de homem não, quer estrutura. Quer que o cara estruture a vida dela. Se ela deixa de ver o homem como estrutura, ela passa pra trás, até mesmo porque só se importa mermo é com os filhos, e olhe lá. Peguei uma de vinte e poucos, a filha com quatro ou cinco, e peguei pra criar. Vixe, isso tem tempo. Chegou agora, tá aí, pedindo pensão, os filhos com carro importado, tudo crecido, e eu aqui só à pé. À pé e trabalhando muito. Aliás, durmo três horas por dia, às vezes duas. Gerente de hotel de noite, de dia toco uma confecção. Inclusive tem encomenda pra Bauru e o Brás todo. Mas é bom rapaz, o trabalho é bom pro homem. Quando eu era mais novo... aliás, voce deve ter uns vinte e dois né? (!)
- Não...
- Nada não, tenho muita experiência, bem te digo. Pior é na guerra! Trabalho duro, mulher pra curtir, boa comida e ser honestidade é o sentido da vida. Ah, o trem está ali, preciso pegar agora. Um abraço mermão!
E saiu em debandada para adentrar o vagão mais próximo. Eita cabra acelerado! No auge da minha relaxada inércia pós labuta, desci calmamente as escadas enquanto o trem se afastava, poucos metros abaixo. Ele já havia entrado.
E não nos parecemos com os gases!?!?

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

ESCUTANDO MERDA


Isso mesmo! Precisamente Balck Merda.  Banda formada nos anos 60 nos EUA pelos guitarristas Anthony e Charles Hawkins, pelo baixista VC Veasey e o baterista Tyrone Hite. É considerada a primeira banda de rock da história essencialmente negra, influenciado fortemente pelo som do The Jimi Hendrix Experience traz a batida forte do blues pesado, porém não tem a mesma agressividade nas guitarras como o lendário power trio do Hendrix. A sonoridade é um pouco voltada para o funk, soul, R&B o que dar um molho a mais para o rock feito pela banda.

Esses caras foram um dos primeiros a fazer essa fusão entre o rock e o funk e certamente foi influência para bandas como Fundadelic e The Bar-Kays. Sempre com letras de cunho social, tratando dos aspectos refletiam a contestação ao preconceito racial da época. Por isso, o nome tão curioso “Merda” que é uma gíria de negro sulista norte americano e significa assassinato, homicídio. Eles têm consciência do significado de “Merda” em português e em Italiano, porém não quiseram alterar e não se incomodam com isso, pois acreditam que o mais importante é o som que fazem. 

É uma banda para escutar com respeito e sem preconceitos, apenas deixa o psychedelic, Folk-Rock-Funk rolar. Já escutamos tantas merdas hoje em dia, então não faz diferença mais uma “Merda”.  Coloca o som no talo que essa “Merda” é boa!

Enjoy!


sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Feels like home


Quarta-feira, dia 01/08/2012, 19:13. Parei minha moto para fazer um lanche em um posto de gasolina onde uma gentil funcionária preparou um desses sanduiches cheios de salada, queijo e molho. Despretensiosamente puxei o celular do bolso e entrei no twitter. Deslizando suavemente o dedo pela tela do aparelho eis que aparece um tweet do @badreligion com as seguintes palavras: “goodbye to a good friend, tony sly”. Veio imediatamente um frio na barriga e a fome sumiu. Teria Tony Sly, vocalista da banda punk que mais amo morrido? Tuitei perguntando a um amigo se isso tinha acontecido e poucos segundos depois veio a confirmação: na manhã desta quarta-feira Fat Mike (vocalista do NOFX e dono da Fat Wreck Chord) havia divulgado uma nota informando o seu falecimento sem dizer a causa. Não consegui conter algumas lágrimas ali mesmo.


O punk rock mudou minha vida durante minha adolescência. Foi um elo que criou os primeiros embriões das minhas grandes amizades, foi o responsável pelo meu interesse em me tornar um músico. O final da minha adolescência foi definido por uma série de conflitos existenciais (acredito que todo jovem que tem mente ativa passa por isso) juntamente com as pessoas que mais amo nesse planeta. Foi dentro do hardcore melódico, do punk, das guitarras excessivamente distorcidas que tentei mudar o meu mundo, aprendi a compartilhar emoções, aprendi a compor as primeiras músicas, trilhei caminhos os quais me enchem de orgulho ao revirar as memórias.

...

Final 1998. Estava na casa de Pinguim, baterista da minha primeira (UNI68) e segunda bandas de hardcore (BSk), ouvindo um disco do NOFX (acho que o Punk in Drublic), quando peguei um CD da sua pilha onde havia um senhor abrindo uma geladeira assustado. Em cima estava escrito “No Use For A Name” e embaixo “Leche com carne”. Pedi para Pinguim colocar para tocar foi amor à primeira “ouvida”. A equalização perfeita das guitarras e a melodia extremamente marcante de uma voz suave muito diferente das demais bandas de HxCx e punk que eu vinha ouvindo. Surtei.




Posso afirmar categoricamente que o No Use For A Name foi (e é) uma inspiração que carreguei durante toda minha vida. Vasculhando minhas memórias acho que consigo afirmar que em todas as bandas que toquei covers do NUFAN foram feitos. Enquanto minha timidez ia perdendo espaço para a minha vontade de gritar aos quatro cantos minhas verdades, o NUFAN ia costurando a cada disco lançado minha trajetória de crescimento como pessoa e minha formação como homem.

Na BSk tocamos com muita vontade “Couch Boy” e “Undefeated” no Idearium uma dezena de vezes; com a mini turnê que fiz com a ACME em 2004 tive o privilégio de cantar para umas duas mil pessoas em Maceió e umas mil e quinhentas em Aracaju “International You Day”, além dos diversos shows na Blue House que Thiago Fonseca (que a essa hora deve estar batendo um papo com o próprio Tony por aí) me chamava para tocar ou cantar alguma música deles; lembro dos meus pulos alucinados nos shows da Sput ao som de “Justified Black Eyes”; no primeiro show da Elipê (eu com meus 23 anos, Laís com seus 16) nós tocamos “This is a rebel song”; sem falar em shows futuros quando “Let me down” ecoava nas paredes do Calipso...


Em 2007 tive uma grata surpresa ao receber um e-mail de Bozo (Thiago Oliveira) que estampava a primeira vinda do No Use For A Name para o Brasil. No primeiro dia de venda garanti meu ingresso e três meses depois fomos para São Paulo na Via Funchal presenciar um dos melhores momentos da minha vida. O som estava perfeito, nossas almas estavam em transe! Liguei pra meus amigos para compartilhar alguns momentos do show, foi um dia de fanboy total!! Inesquecível...






Minha relação com o NUFAN não é meramente um fã que aprecia uma simples banda de hardcore, mas sim a representação de anos maravilhosos da minha vida que os bons ventos não trazem mais. Um símbolo, um ícone de anos emocionalmente intensos, conflituosos, deprimidos, eufóricos, explosivos e de muito aprendizado. E a morte prematura de Tony Sly (apenas 41 anos) me deixou extremamente triste, além de tudo por saber que o NUFAN entraria em estúdio no segundo semestre desse ano para gravar mais um disco. Um grande compositor, uma bela voz, um músico que admiro e vou carregar comigo até o fim da minha vida. Esteja onde estiver, espero que esteja bem e com a certeza do dever cumprido. Certamente um cara da Califórnia não faz a menor ideia de como ele embalou a vida de jovens baianos que se potencializaram na música e como suas canções nos modificaram. Obrigado por tudo, Tony Sly.


Feels Like Home

It's too late to talk to you
And it's too soon to say good-bye
Listen where ever you may be
You still live inside my mind


Something tells me that you are free again
In a place that feels like home


It's never easy to understand
Why memories hold our hand
But people let go